segunda-feira, 21 de março de 2011

ANALU (por Leandro Rocha)



Estava Analu sozinha naquele bar, vestido branco, bordado por rendas, contemplando o vazio, e pensando maneiras de trocar de vida. Meio sem querer e sóbria, encontrou um desconhecido que lhe roubou um beijo e lhe fez uma proposta indiscreta.  Antes mesmo de namorarem firme ela engravidou dos gêmeos, Adão e Vivian, seus futuros filhos. Feliz, casou-se e o desconforto da solidão se foi. Dedicou-se inteiramente ao modelo “família”, experimentando com paixão o dia-a-dia e se esquecendo dos antigos desejos não realizados. Mas com o tempo, foi surgindo um descontentamento pela repetição das coisas, dos sorrisos de conveniência, dos deveres e afazeres domésticos. Agora havia uma inquietação constante. Nas conversas com amigos, Analu falava sobre assuntos cotidianos e parecia bem. E ninguém percebia o apelo silencioso em seus olhos. Certo dia, ela passou a colecionar panelas, depois toalhas de mesa. Comprou muitas roupas para as crianças e começou a presentear excessivamente os amigos com livros que não tinha lido, mas desejava ler. Tentava de tudo para evitar aqueles pensamentos de incerteza e fuga que a perturbavam. Beijava seu companheiro Silas, marido responsável e pai dedicado, e não sentia mais vontades íntimas com ele. A inquietação a rodeava. Analu amargava com o desejo insano de largar tudo, seu lar, filhos, marido, seu mundo, pelo desconhecido. Após o almoço de uma tarde de sábado deixou as crianças na casa de sua irmã. Despediu-se, como se saísse para fazer compras, disfarçando as lágrimas e o tremor das pernas. E resolvida se dirigiu ao aeroporto, levando consigo somente as roupas do corpo e um sorriso de satisfação.

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