Uma lembrança minha, talvez nunca a tenha tido, me faz recordar de alguém dizendo que os desejos podem se assemelhar a pequenas orações. Que estes são a carência de algo que nos faz falta. Sem nunca termos sido possuidores desse “algo” temos a sensação nostálgica, a quase lembrança, de o havermos possuído. E, talvez por isso, soframos, procuramos, nos desesperamos pelo objeto desejado.
Ah, desejo, mandinga, maldição dos deuses, proibido-permitido, diabo do conhecimento, desconhecido-ansiado, Lilith, entidade que nos aprisiona e que cavalga a todos. Desejo, “o que será que será” cantado por tantos apaixonados que cobiçam a maçã da luxúria e de outros fins. Ele nos move como se fôssemos marionetes de Deus. O combustível é a crença em alcançarmos o rastro do que este abriga. A fé em alcançar o que se deseja é tanta que nossa vaidade nos faz carícias e até gostamos. Ao ponto de nos sentirmos ofendidos, quando alguém nos critica, e de ficarmos inebriadamente felizes quando elogios nos são enviados ouvido adentro. Assim, enganados pelo fantasma da vaidade podemos cair antes de “tocar” nesse “algo”, objetivo do desejo, metamorfo sagrado que nos habita desde a origem dos tempos. Uma vez que a vaidade poderia nos desviar do que seria o centro do desejo, evitemos sua ofuscação. Do contrário, um elogio ilusório ou uma crítica destrutiva ceifariam as projeções desejosas de um esperançoso.
Para alcançarmos o que desejamos, expectativas nos empurram a agir. Pois, o desejo é o prenúncio das ações. Primeiro são as sensações. Depois, o pensamento, o formigamento do corpo, os sonhos, miragens, a agitação. De repente, atitudes são tomadas; outros pensamentos chegam para nos limitar; alguns nos incentivam, movendo, bulindo, mexendo e aí: “lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá”. Nesse ponto já fomos abocanhados por essa metafísica forrageira que come, come, come e ainda que farta muda o cardápio para continuar se enchendo. Entretanto, nunca se sacia. “Desejo, necessidade, vontade”, impulso fulminante, fagulha contagiosa que nos arrasa a todos. “Buscar pelo prazer de procurar, não pelo de encontrar”. Afinal, de que se compõem as emoções humanas senão a partir dos desejos? Seria este o mantenedor da vida? Poderia o desejo ser a essência do homem? Estaria, então, o propósito da humanidade encerrado neste insaciável Ouroborus?
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