quarta-feira, 23 de março de 2011

VAZIO (por Leandro Rocha)




Nos caminhos que não são passagens, coisas brotam tendo sempre estado lá. Indo. Vindo, num movimento constante, espelhos, pedaços de reflexos, cacos de sombras e arrastar de correntes partidas. Quem soube de mim foi o ontem fazedor de anseios e nostalgias, afetuoso, repetido, insistentemente repetido, um “kyrie eleison” de uma missa cantada por índios, catequizados há séculos atrás, soando sem sofrimento, com ingenuidade sagrada.
No lugar vazio, dos que se acham perdidos na solidão, está o silêncio dos clamorosos, semelhantes, que não se veem. O tácito contato incorpóreo  destes, conta histórias e literaturas de todas as humanidades, de todos os Borges e Shakespears, de todos os que são em essência amigos na virtude. Mesmo sem ao menos terem dirigido uma única palavra ou gesto, estes se conhecem como íntimos e sonham lembranças e saudades do futuro que demora a amadurecer.
No lugar vazio de si-mesmo: aparências, ideias intocáveis, Oroborus dos sonhos e das gentes. Neste lugar encontra-se uma assembleia dos homens da chuva. Talvez, para tratar dos assuntos pertinentes à chuva, ou relacionados ao tempo e à duração das coisas. Encontram-se também os seres do não-além, do limite de concepção de um pensamento, do não-ser, ser, não-ser, permanecendo assim a luz enxergada pelos cegos.
No lugar vazio, do vazio, está o nada imaginado por um visitante de eras longínquas que sem compreender as dimensões de sua criação nos legou o conteúdo da Caixa de Pandora. Irresponsavelmente e, no entanto, sem culpa, nos habilitou à angústia de um novo sentimento: a falta.

2 comentários:

  1. Oi Leandro!
    Que delícia te ler, tão lírico, lírios.
    Obrigada pelas palavras postadas no blog do Casarão.
    Você faz muita falta por aqui!
    Esperamos por você um dia aqui no nosso Casarão de Poesia...

    Um beijo!

    Iara

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  2. Tb tenho saudades das nossas conversas após os ensaios do coral e toda aquela energia q vcs tem aí em Currais. Vamos acabar com essa saudade montando um projeto poético-musical. Q tal?

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