O papel governa o mundo pois somos feitos de papel.
Quando nascemos ganhamos um nome escrito, registrado junto com as informações pertinentes ao que somos num papel. Quando morremos, novamente o papel informa os detalhes, o motivo, a data e a hora do óbito. O dinheiro, “papel sujo”, governa o mundo todo com suas diferentes figuras e valores impressos. Uma vez tentaram fazer cédulas de R$10,00 de plástico. Acabou não dando certo. Se você quiser fazer ou solicitar algo, só se for por meio de papéis de ofício, projetos, propostas. Se quiser comunicar os acontecimentos será imprescindível um relatório de papel. Para dizer quem você é, o que sabe, sua história profissional, currículo de papel. Até mesmo para usar o banheiro você precisa de mais papel. Saber as notícias cotidianas, jornal de papel. Se for roubado e perder os documentos, “amigo, cadê o boletim de ocorrência?” (de papel). Quer morar numa casa? Primeiro o arquiteto tem de desenhar uma, no papel. Também os baús do conhecimento, os livros, são compostos de papéis organizados em letras vindas da cabeça de alguém. E o que seria uma biblioteca senão o reinado do papel? Entretanto, quando os papéis se acumulam: lixo! ou reciclagem. Aí, no meio desta bagunça você encontra um papel-bilhete premiado da loteria e se torna o mais novo milionário.
A palavra de um homem já não merece confiança, a menos que esteja grafada num papel. Só confiamos nele. Nem mesmo a verdade escapa de ser diferente quando o papel testemunha o contrário. Os artistas, coitados, são os mais dependentes dele. Há papel nas partituras dos músicos, coberto daquelas bolinhas e pauzinhos misteriosos, nos textos que os atores interpretam, nos roteiros dos cineastas, nas telas onde desenhistas e pintores expressam sua arte. E crivem, até na coreografia dos bailarinos.
Ah, o que faremos quando chover?
Não compreendi a razão para o tom fatalista. Por acaso não precisamos de um lugar para perenizar nossos pensamentos e ideias? O registro em meio material, seja lá o que for, não lhe parece indispensável? Como compartilharíamos o pensamento em escala sem o registro?
ResponderExcluirA cultura oral teve seu tempo. O registro escrito, como conhecemos, já vislumbra seu ocaso. No entanto, a necessidade de perenizar e compartilhar ideias sempre estará por aí, escravizando-nos sim, mas determinando quem somos enquanto civilização.
Abs.
O tom fatalista deve-se à experiências da vida prática que se emperra qd os papeis dizem que o que vc é ou faz diferem, entram em conflito com os fatos que dizem quem vc é ou como vc está. Vc pode ser um artista maravilhoso no papel, doutor, presidente...sem sê-lo. Contato, todos acreditam por q vc mostrou sua identidade, o diploma, sei lá. Alguns são “em si mesmos” alguma coisa na vida real e não podem entrar no sistema pq a falta de um papel os impede burocraticamente de se porem a prova.
ResponderExcluirO lugar que dispomos para descansar nosso pensamento, o meu pelo menos, ainda é o papel, pois se eu estiver com a cabeça cheia de coisas p fazer escrevê-las num borrão é meu único modo de conseguir dormir. Contudo, esse registrar obsessivo tão cultivado por nossa civilização, que insiste em atestar “as verdadeiras verdades”, ao mesmo tempo em que é um invento de avanço tecnológico de nossa sociedade é tb um atraso de milênios. Minha crítica não defende um retrocesso à cultura oral. Nem tão pouco deposita esperanças na comunicação cibernética, digital, internética. Talvez. o desabafo seja uma forma de invocar a anarquia das palavras contra a ordem de prisão imposta pela ação dos símbolos escritos. Vai saber!